quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Serviço Social não é caridade

A filantropia no Brasil:

Entre a caridade e a política de assistência social:

A constituição da alcunha filantropia como expressão de determinado modo de relação social, teve como cenário a Grécia antiga: berço da democracia ocidental. ABBAGNANO (2000:441) refere-se a compreensão que tinham Aristóteles e os Estóicos desta palavra: Amizade do homem para com outro homem, entendida como vínculo natural, visto que nenhum homem poderia ser alheio a outro homem. Este conceito também foi atribuído a Platão que o entendia sob três aspectos: saudação, ajuda e hospitalidade. O homem como ser social por essência justificava a naturalização destas relações, considerando ainda que a igualdade e a democracia fossem devidas àqueles que tinham o status de cidadãos.

A ajuda ao outro, enquanto prática social nasceu no interior da sociedade civil (SPOSATI, 2006) e foi historicamente referendada pela Igreja Católica que, durante um longo período histórico, alicerçou as condutas morais de seus seguidores na caridade e amor ao próximo, ainda que num contexto europeu dividido por estamentos sociais rígidos, determinantes da ocupação das classes naquelas sociedades. O atendimento às famílias pobres foi apontado por VIEIRA (1994) no pioneirismo de São Vicente de Paula (1576 – 1660), quando era vigário em Chatillon-les-Dombes, na França do século XVII.

A vida comunitária nos feudos e pequenas propriedades rurais na Europa requereram de seus habitantes atitudes de ajuda mútua, seja na produção de bens para o atendimento das necessidades materiais de existência, como também nos acontecimentos ligados aos ciclos de vida e defesa desta, contra as intempéries provocadas por catástrofes da natureza, doenças e guerras. A proteção do grupo tinha como lócus a família, cujo pressuposto era a proximidade entre seus membros.

Mas, foi no marco do modo de produção capitalista que as relações sociais assentadas no mutualismo dos grupos sociais sofreram uma erosão em suas bases constitutivas. Pois, enquanto sistema gerador de desigualdade como princípio fundante, o antagonismo de interesses entre trabalho e capital estabeleceu novas relações de produção na base infra-estrutural societária como também na produção e reprodução da base política–ideológica, constituída pelo Estado, pelo direito e pelas formas de consciência social.

A propriedade privada dos meios de produção e a mercantilização como substrato da sociedade capitalista, passaram a determinar o lugar social daqueles trabalhadores inseridos no processo produtivo dos quais se extrai a mais – valia, e daqueles cuja força de trabalho não interessava imediatamente ao capital e, portanto, cumpriam a função de exército industrial de reserva. A estes relegados do processo produtivo, restavam apenas a caridade, a benemerência, e a filantropia, como resposta às suas indigências.

O Estado moderno, longe de representar o bem comum, expressou no decurso da história o campo de lutas advindo das contradições da sociedade, com claro predomínio dos interesses da burguesia que o prescreveu como regulador contratual da sociedade industrial. Foi na Alemanha do século XIX, que Otto Von Bismarck (1883) introduziu para o estado o papel de provedor de necessidades de reprodução social, passando a regular os incipientes benefícios de seguro social, antes operado pelas caixas de mutualidades, sendo estes: seguro doença, acidentes do trabalho, amparo à invalidez e amparo a velhice. Neste momento, o desemprego ainda não representava risco social para a sociedade.

Contudo, foi apenas no século XX, na Inglaterra, com Lorde Beveridge (1942) que a idéia do Estado como protetor das necessidades coletivas, numa concepção de que estas pairam acima das individualidades, como condição de referência, efetiva-se. O estado protetor como padrão de reprodução social, através do estabelecimento de políticas sociais, denotou uma transição entre as ações que antes se estabeleciam no plano individual para o plano social (SPOSATI, 2006).

Esta nova construção do estado perante as necessidades sociais deu-se a partir do confronto propiciado pela luta de classes e a intensificação dos movimentos associativos e sindicais fundados numa sociedade industrial cuja lógica estruturou-se a partir da formação da sociedade salarial que se constituía como a principal força produtiva do processo do desenvolvimento econômico do capitalismo monopolista.

No contexto da história política contemporânea, o pós - segunda guerra mundial configurou a bipolarização do mundo em duas tendências político–econômicas antagônicas, representadas por suas potências: Estados Unidos da América, em sua hegemonia capitalista e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, representando o viés socialista. Tendo como meta a ampliação de seu domínio[1], os Estados Unidos passaram a adotar políticas de “ajuda econômica” ostensiva na conquista dos mercados e garantias militares junto aos países de capitalismo periférico, em especial no Brasil. [2]

Nos países de capitalismo maduro e central, a democracia exigiu como fundamento a cidadania, destensionadora dos conflitos de classe, emergindo assim novas formas de coesão social, e o estado a processá-las como padrão de regulação social e de direito social. Isto quer dizer que a proteção social gestionada no aparelho estatal deveria prover as condições básicas de vida. O pacto do estado com a sociedade civil preconizou um padrão de cobertura construído historicamente, no qual perpassou a aliança entre o modelo produtivo (de padrão fabril) Fordista com o modelo de proteção social Keynesiano, garantindo por três décadas a “Era de ouro do capitalismo mundial” (1940 a 1970), com altos índices de crescimento econômico.

Conforme SPOSATI (2006), a presença de formas laicas no campo da assistência social no Brasil deu-se no pós – república, tendo em vista a separação oficial entre o estado e a igreja. No alvorecer do século XX, o Brasil manteve como característica de sua formação sócio-histórica o conservadorismo de uma sociedade elitista no acesso às riquezas sociais e sua acumulação, garantida por uma oligarquia latifundiária que detinha os poderes político e econômico[3]. A economia marcada pelo cunho liberal viabilizou o início da industrialização e o intenso processo de urbanização, na região mais rica do país até aquele momento, a região sudeste.

Desde o século XVIII, a filantropia e a assistência social associavam-se intimamente às práticas de caridade no Brasil. Dependiam de iniciativas voluntárias e isoladas de auxílio aos pobres e desvalidos da “sorte”. Estas iniciativas partiam das instituições religiosas que, sob o prisma da herança moral cristã, dispensavam seus cuidados, oferecendo abrigos, roupas e alimentos, em especial às crianças abandonadas, aos velhos e doentes em geral. É mais do que reconhecido o papel de organizações como as Santas Casas de Misericórdia no país como também atividades desenvolvidas por várias ordens religiosas.

Foi apenas no governo de Getúlio Vargas que se criou o Conselho Nacional de Serviço Social[4], cujo primeiro presidente foi Ataulpho de Paiva que havia proposto a criação de uma assistência pública no início do século XX. Em 1942, foi criada a Legião Brasileira de Assistência – LBA, sob a forte influência das primeiras damas, uma vez que a Sra. Darcy Vargas foi sua primeira presidenta. Estas senhoras deram capilaridade à assistência social em todo o território nacional (SPOSATI, 2006).

O atendimento das repercussões da pobreza e da miséria deixou de ser “caso de polícia” tal como se afirmava na década de 20 (do século XX), mas assumiu em seu trato o âmbito da moral privada, numa lógica conservadora da assistência social em sua versão filantrópica:

O trato da assistência social no âmbito da moral privada, e não da ética social e pública, é um dos equívocos dessa versão filantrópica. O primeiro – damismo, a benemerência está no âmbito da moral privada. Neste sentido, é que os conservadores pretendem agir (e agem) modelando a atenção àqueles mais cravados pela destituição, desapropriação e exclusão social, organizando atividades que vinculam as relações de classe, sob a égide do favor transclassista, do mais rico ao mais pobre, com a vinculação do reconhecimento da bondade do doador pelo receptor. (...).

O modelo conservador trata o Estado como uma grande família, na qual as esposas de governantes, as primeiras damas, é que cuidam dos “coitados”. É o paradigma do não direito, da reiteração da subalternidade, assentado no modelo de Estado patrimonial (...). Neste modelo, a assistência social é entendida como espaço de reconhecimento dos necessitados, e não de necessidades sociais. (SPOSATI, 2001:76).

O Conselho Nacional de Serviço Social - CNSS era o órgão estatal que atribuía parecer quanto à concessão de recursos estatais, sob a forma de subvenções, para entidades sem fins lucrativos, uma vez que o estado passou a regular a cooperação financeira da União com entidades privadas, por intermédio do Ministério da Educação e Saúde (GOMES, 1999:93). As instituições assistenciais eleitas deveriam prestar serviços sociais sob a forma de ações de assistência social, de saúde, de educação e de cultura. GOMES (1999) aponta a obrigatoriedade de registro no conselho a partir de 1943 e que este assunto foi condensado na Lei nº 1.493 de 1951, utilizada até a criação do órgão que o sucedeu a partir da Lei Orgânica da Assistência Social em 1993: o Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS.

No Brasil, concomitante a subvenção estatal às instituições privadas e do atendimento da LBA nas áreas urbanas, os programas sociais junto às comunidades rurais, seletivos e focalistas, efetivaram-se sob a ajuda técnica e financeira da Organização das Nações Unidas (sob a batuta do governo norte-americano), cujo ideário reforçava a visão de retirá-las do atraso em relação ao desenvolvimento sócio-econômico requerido. Esta concepção teve como referência o conceito dualista de desenvolvimento do capitalismo, ou seja, o Brasil possuía áreas subdesenvolvidas convivendo com áreas desigualmente desenvolvidas. O setor atrasado era disfuncional ao setor moderno. Este discurso foi amplamente incorporado pelo setor governamental na década de 50 (do século XX). (AGUIAR, 1985).

Várias foram às regulamentações posteriores que previam a isenção previdenciária[5], para as entidades definidas como filantrópicas. A certificação de enquadramento que concedia acesso à isenção previdenciária, definia a natureza das entidades filantrópicas aos critérios contábeis e jurídicos. A isenção de impostos sobre a importação de produtos foi legada às entidades que se dedicavam à assistência social em 1965.

Foi apenas com a Carta Constitucional de 1988 que a Assistência Social configurou-se como política pública integrando o tripé da Seguridade Social junto das políticas de saúde e previdência. Desse modo, alçou o reconhecimento do estado brasileiro pela sua responsabilidade normativa e exeqüibilidade frente às necessidades sociais. A constituição cidadã foi produto de intensos embates entre os setores progressista da sociedade, representados pelos movimentos sociais, que lutavam pela extensão das políticas públicas universalizantes, descentralizadas e participativas sob a égide do estado, e pelo setor conservador que desejava dispositivos político-econômicos liberais privilegiadores do mercado. Estes projetos societários antagônicos foram colocados em disputa.

Na Constituição, o artigo 203 dispõe sobre os objetivos da Assistência Social e estes reaparecem no artigo 2º da Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS (Lei regulamentadora), devendo ser atividade voltada para a promoção dos direitos sociais, pois o que lhe dá sentido é a efetivação do estado democrático de direito, possibilitando a inclusão social e a emancipação daqueles cidadãos que não teriam outra forma de ter seus direitos sociais assegurados como, por exemplo, os referidos no artigo 6º da Constituição: educação, saúde, moradia, lazer, entre outros deles decorrentes (AZEVEDO, s.d.).

GOMES situa a Constituição Federal de 1988 como o marco referencial da Seguridade Social e evidencia o trato previsto para a isenção previdenciária destas organizações:

A Constituição de 88 contempla, no capítulo da Seguridade Social, artigo 195, parágrafo 7º, a isenção da contribuição previdenciária às “entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei”, (...). Acrescente-se que o artigo 150, inciso VI, alínea c, veda a instituição de impostos sobre o patrimônio, renda ou serviços das instituições de educação, e de assistência social sem fins lucrativos. GOMES (1999:94).

O texto constitucional previu diferentes nomenclaturas para as áreas da seguridade social: se na Assistência Social as entidades são denominadas beneficentes de assistência social, na saúde são chamadas filantrópicas sem fins lucrativos. No capítulo da família, da criança, do adolescente e do idoso são tratadas como entidades não governamentais – artigo 227, parágrafo primeiro (GOMES, 1999: 95). O assunto foi regulamentado com a lei[6] que tratou da organização da Seguridade Social e seu plano de custeio, em 1991.

Em 1993 é criado o Certificado de Entidades de Fins Filantrópicos, através de um Decreto[7], que reiterava as isenções para instituição beneficente de assistência social, educacional ou de saúde sem fins lucrativos, postulando a obrigatoriedade destas entidades a aplicarem a gratuidade de atendimento no percentual mínimo de 20% de sua renda bruta. Ainda, ampliava para as entidades de saúde a dispensa de tal exigência quando estas oferecessem ao Sistema Único de Saúde, 60% de sua capacidade de atendimento. Neste rol classificavam-se as Santas Casas e as APAES (Associação de pais e amigos dos excepcionais).

Apesar da edição da Lei Orgânica da Assistência Social[8], a qual caracterizava as ações compreendidas como de assistência social, continuou o impasse com relação à qualificação das organizações que teriam o benefício da isenção de contribuição à Seguridade Social, devido ao descompasso com as normatizações anteriores e pelo limiar de competência do Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS, para proferi-las, em particular com as entidades da área de saúde e educação.

GOMES (1999) atribuiu a impropriedade da denominação filantropia para estas entidades que requeriam do poder público o financiamento, uma vez que eram co-executoras de políticas públicas. Ao serem indevidamente classificadas como filantrópicas, sem demonstrar o mérito de ação assistencial, reiteravam a cultura clientelística e da tutela ao revés da concepção do direito fundamentado numa política pública, universal, descentralizada e participativa.

A reatualização e reconfiguração das antigas práticas de caridade por parte de organizações do terceiro setor como também das organizações empresariais, sob novas denominações como: ações assistenciais, sociais, filantrópicas, de responsabilidade social, entre outras expressões, denotam a complexidade do tema enquanto novos rearranjos dos padrões de sociabilidade e a urgente explicitação de suas determinações sociais e implicações no campo das políticas públicas, no interior do desenvolvimento capitalista brasileiro. CAMURÇA (2005: 45) produz a seguinte reflexão:

Essa história “submersa” da “caridade” no Brasil, marcada pelo donativo personalizado, baseado em valores cristãos e centrados em relações de reciprocidade e redes religiosas, hoje emerge adquirindo visibilidade e combinando-se com programas governamentais e empresariais, em meio a transformações recentes nas articulações que visam à constituição de uma “sociedade civil”.

A Comissão de Normas do CNAS, em parceria com consagradas instituições de ensino, intensificou o aprofundamento de estudos sobre a constituição e normatização das entidades de assistência social, os quais resultaram em diversos trabalhos científicos entre os anos de 1994 a 1998 (GOMES, 1999). Contudo, o governo manteve-se alheio a estes e propôs por diversas vezes mudança na legislação com o intuito de resolver o seu problema de arrecadação fiscal. Mas, enquanto campo de disputa entre os diversos interesses, em especial aos que se privilegiam com a isenção, o poder governamental não obteve sucesso, uma vez que as suas tentativas foram frustradas pelas forças político - partidário destes grupos.

Ainda que nova regulamentação, como o Decreto Nº 2.536 de 1998, alterasse a concessão dos certificados de filantropia, as entidades que prestavam atendimento nas áreas de educação e saúde continuaram a ser contempladas com a isenção, sendo exigida as suas inscrições nos conselhos municipais de assistência social. Apesar do acúmulo de saber produzido por intensos debates e proposições quanto à regulamentação da assistência social, o CNAS não foi chamado a participar da elaboração deste decreto.

O governo de Fernando Henrique Cardoso propõe uma reforma na previdência social seguindo um projeto de governo de mudanças estruturais liberalizantes, cujas políticas deveriam seguir um ajuste fiscal. Assim, foi promulgada a Lei Nº 9.732 de 11/12/98 que alterou os critérios de isenção à contribuição da Seguridade Social. Características desta Lei:

- Entidade beneficente de assistência social: “promove gratuitamente e em caráter exclusivo a assistência social beneficente a pessoas carentes, em especial a crianças, adolescentes, idosos e portadores de deficiência”. Entende como assistência social beneficente à prestação gratuita de serviços e benefícios a quem dela necessitar (GOMES, 1999).

Na esteira do continuísmo, as entidades de saúde que ofertassem a prestação de serviços de pelo menos 60% ao Sistema Único de Saúde, também seriam consideradas de assistência social beneficentes.

A Lei Nº. 9.732/98 foi objeto de intensos debates e nova regulamentação, colocando-se como alvo de disputas de interesses dos diversos grupos, tanto conservadores das benesses como também daqueles que queriam corrigir suas distorções e direcioná-la na perspectiva direitos sociais. Desse modo é publicado o Decreto nº 3.048 em 07/05/99 e republicado com correções em 12 de maio, cujo teor é o novo regulamento da Previdência Social sob a ótica da reforma do estado mínimo (GOMES, 1999:101). Define pessoa carente a partir do viés econômico de uma renda mensal familiar inferior ao salário mínimo vigente, sendo o mesmo critério utilizado para o aluno carente de curso superior.

As Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIPs são a expressão mais atualizada do crescimento e fortalecimento do chamado terceiro setor no Brasil, regulamentada pela Lei nº 9.790 de 23/03/99, como entidades privadas, sem fins lucrativos, que ocupam o espaço público não – estatal, em conformidade com os princípios de universalização dos serviços, cujas finalidades estejam voltadas para a promoção de assistência social, cultura, educação, saúde gratuita, segurança alimentar e nutricional, defesa dos direitos e do meio ambiente, promoção da ética, da paz, da cidadania e da democracia, do desenvolvimento econômico e social e combate à pobreza, produção de estudos e pesquisas (GOMES, 1999:104).

A questão que se coloca como desafio atual é a possibilidade de parceria entre o público e o privado, ou seja, a formação de vínculo entre estas organizações e o poder público estatal para o fomento e execução de atividades de interesse público, sujeitas ao controle social. Mais uma vez na história sócio-política brasileira há uma tentativa de transferir serviços sociais de responsabilidade do Estado para a iniciativa privada, com os seus respectivos fundos de financiamento. As OSCIPs poderão ser escolhidas através de edital público para esta parceria[9]. O termo de parceria permite a remuneração dos diretores e o pagamento de despesas de custeio com os recursos repassados, diferentemente do tradicional termo de convênio.

O financiamento estatal para as entidades consideradas de assistência social, através da isenção da contribuição a seguridade social, não se pauta no mérito de suas execuções, tão pouco na qualidade e na real aplicação aos seus destinatários, ou seja, são campos “nebulosos” para a fiscalização e controle social (através dos conselhos de direitos estaduais e municipais, como também dos fóruns populares) e efetivação de políticas públicas, uma vez que a legislação pauta como requisitos à obtenção das isenções, tão somente, um volume de documentos que obedeçam a critérios normatizadores jurídicos e contábeis oriundos dos diversos órgãos e autarquias públicas responsáveis por suas emissões.

Considerações finais

Historicamente no Brasil as ações filantrópicas estiveram arraigadas à concepção caritativa de ajuda ao próximo sob o prisma da moral cristã, na qual há o reconhecimento do valor da pobreza como redentora dos pecados.

Foi no período de Getúlio Vargas que o estado assume a primeira iniciativa de criar uma assistência pública no interior do aparato governamental, efetivada pela Legião Brasileira de Assistência (1942) sob o comando da primeira dama. Esta organização legitimou o estado patrimonialista e populista numa lógica conservadora da assistência social em sua versão filantrópica, reiterativa das práticas de cunho moral, subalternizadora para quem recebe a ajuda frente aquele que a oferece e, a manutenção da pobreza como condição “natural” da sociedade e não como subproduto da desigualdade capitalista, na lógica do não direito ou do favor.

É interessante observar, ao longo do percurso histórico, que o estado brasileiro reconheça a existência de entidades filantrópicas, regulamentando seus fins sociais e a cooperação financeira praticada para com as mesmas. Através de isenções de impostos, em particular os previdenciários, subvencionou organizações privadas que executavam políticas públicas, exigindo-se em contrapartida a gratuidade de atendimento para a população pobre.

Com a Constituição de 1988, a isenção da contribuição previdenciária às entidades classificadas como filantrópicas manteve-se. Várias normatizações infraconstitucionais seguiram-se regulamentando as ações para a obtenção de certificação de entidades de fins filantrópicos, contudo, apesar da edição da Lei Orgânica da Assistência Social continuou o impasse para qualificar estas organizações.

Ao serem indevidamente classificadas como filantrópicas, por não demonstrarem mérito de sua ação assistencial, reiteram a cultura clientelística e da tutela ao invés da concepção do direito social. Além do que muitas não estão ao alcance da fiscalização dos conselhos de direitos sociais na aplicação dos recursos públicos.

O crescimento do terceiro setor, em sua vasta composição de entidades privadas sem fins lucrativos, demonstra que houve uma transferência de responsabilidade na execução políticas sociais públicas para o setor privado, em particular na década de 90. Como este setor vem se profissionalizando cada vez mais, a área de assistência social configura-se como campo de disputa dos diversos interesses representados por forças político-partidárias.

O reconhecimento da Assistência Social como partícipe do tripé da seguridade social e, portanto, política pública contida na Carta Constitucional de 1988, requer novas relações sociais entre o poder público, prestadores de serviços sociais e população usuária, numa concepção fundada no estado democrático de direito e desse modo passível do controle social, através dos fóruns populares e conselhos de direitos sociais, na exigência permanente de transparência sobre a aplicação do fundo público e seus destinos em prol do atendimento efetivo das demandas coletivas.

Um comentário:

  1. Esse blog está muito dez,falando de Serviço Social a nossa profissão, está cada dia crescendo mais, para poder intervir nos esclarecimentos a população de seus direitos sociais,e ampliando a efetivação das Politicas Publicas.

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